Uma viagem a “Chromatica”: o planeta de cura e redenção de Lady Gaga

A previsão dizia que seria em 10 de abril. Entretanto, foi somente em 29 de maio que o planeta Chromatica se alinhou com o planeta Terra. É lá que Lady Gaga mora desde que cancelou a Terra. Saindo de um espaço predominantemente escuro e rock ‘n’ roll, data de 2013 o período que Gaga encontrou outras cores para sua vida e foi extremamente mal interpretada por aqui ao tentar mostrá-las. A Terra estava cancelando-a e ela apenas retribuiu o favor.

Durante os últimos sete anos, Gaga partiu em direção a outras aventuras, em outros lugares. Saiu do seu planeta confortável e experimentou outras vivências. Mudou de cenário e foi extremamente bem recebida por onde passou. Tocou jazz num lugar, country no outro. Volta e meia encontrava com algo que remetia ao seu planeta natal que sempre mostrava ser uma perfeita ilusão. Recebeu inúmeros codinomes pela galáxia, mas o mais popular era “uma estrela que nasceu”.

De longe, a Terra ouvia rumores do que Gaga estava fazendo pelo universo. O sucesso que havia conquistado aqui estava sendo repetido em outros lugares, de outras formas. A cada ano que passava, a saudade batia mais forte. A cada notícia sobre seu estado, ficava cada vez mais claro que ela estava num lugar melhor e que não retornaria. De longe, tudo parecia bem. Seu tempo na Terra havia sido vivido e passado. A Terra a maltratou e tinha que lidar com a saudade. Era sua sentença.

Mas, mesmo tendo visitado tantos lugares e ter conquistado tanto, nem tudo estava tão bem quanto parecia. A Terra, mesmo ofensiva, ainda era seu lar. Seu refúgio em Chromatica tinha tempo determinado. Em breve, o planeta se alinharia com a Terra e estaria mais próximo que nunca dela. Gaga sentia saudades de casa e tinha muito pra falar de suas novas experiências. Talvez, motivado pela saudade, seu planeta natal a receberia melhor. E se… ao invés de voltar pra Terra, ela a convidasse para irmos a Chromatica?

E assim ela fez! Todos fomos convidados a visitar seu novo planeta, com muitas cores vibrantes. Elas remetem às cores que Gaga havia tentado nos mostrar anos atrás (em meados de 2013), mas aqui elas brilham mais fortes. Dividido em três regiões, Gaga nos guia por cada um desses espaços mostrando que, ainda que distintos, em cada um deles há um pedaço dela. E, em suas próprias palavras, nenhum deles é maior que o outro. Um planeta guiado pela igualdade para seus habitantes, algo que ela buscava desde o início de sua trajetória na Terra.

Visitando a primeira região, “Chromatica I”, fica claro que aqui tudo é vivo e pra cima, até mesmo quando não deveria ser. A atmosfera é dançante mas as letras que são apresentadas contam histórias menos animadoras que suas melodias. Em “Alice”, Gaga busca voltar pra casa, para seu país das maravilhas; em “Stupid Love”, ela clama por amor; em “Free Woman”, um clamor pela liberdade. Mesmo tendo vivenciado novas experiências, em “Fun Tonight”, Gaga continua se vendo presa em si mesma. Entretanto, ela está disposta a estar agradecida por estar viva, como canta junto com Ariana Grande em “Rain On Me”. Terminamos de conhecer a primeira região relembrando quem é a Lady Gaga que a Terra conhece. Por isso ela havia escolhido “Stupid Love” e “Rain On Me (feat. Ariana Grande)” para serem suas mensagens de convite a esse planeta: a familiaridade.

A entrada na segunda região, “Chromatica II”, é tão fluida que nos deparamos com “911” quase como uma aparição. Nessa área, tudo soa mais robotizado. A voz de Gaga muda, a melodia continua dançante mas menos explosiva e mais contínua. As letras, entretanto, continuam sendo sobre sua trajetória. Em “911” entendemos melodicamente como Gaga se sente com o uso de seus remédios antipsicóticos, bem como porque os utiliza, em “Replay”. Apesar disso, ela deseja ser tratada com a dignidade de um ser humano, como entoa em “Plastic Doll”. Todas essas são informações novas que Gaga oferece. Sua personalidade “Sour Candy” é apresentada, em parceria com as meninas BLACKPINK. E, mesmo sendo tudo novo, Gaga ainda tem outras camadas que a mantém como um “Enigma” para todos. É nessa região que sabemos exatamente como Lady Gaga se enxerga. Se em “Chromatica I” ela mostra o que quer, em “Chromatica II” ela mostra quem acredita ser.

Os violinos que nos recepcionam em “Chromatica III” são mais dramáticos que os que nos receberam nas regiões anteriores. A atmosfera aqui começa angelical e passa rapidamente para algo empolgante. O clima não é só de festa, é de uma celebração maior. As regiões anteriores são dançantes mas aqui há a necessidade de se perder. “Sine From Above (feat. Elton John)” se mostra um dos maiores trabalhos melodica e liricamente falando de Lady Gaga e combina muito bem com a sucessora “1000 Doves”. A essência do planeta parece ser essa: de redenção e cura. Por fim, somos encaminhados para o fim da visita ao planeta ao som de um coro que nos diz para lutarmos por nossas vidas. Com palmas e poses de oldway vogue, “Babylon” fecha nossa tour por esse planeta que distrai seus problemas com melodias empolgantes.

Mais que um planeta de cura, Chromatica é um planeta de redenção. Não da Gaga com planeta Terra, mas do planeta Terra com Gaga. Durante “Chromatica II” vemos inúmeros elementos que remetem ao seu trabalho de 2013, “ARTPOP”, responsável pelo seu anteriormente citado cancelamento na Terra – como a intro da faixa “ARTPOP” ser similar a de “911”, por exemplo. No fim de “Chromatica III”, em “Babylon”, também há um retorno à faixa “Black Jesus + Amen Fashion”, do “Born This Way”, de 2011. A cantora se autoreferencia em diversos momentos mostrando que o pop é seu planeta natal e que não está fazendo tão diferente do que costumava fazer. Suas parcerias foram bastante acertadas e dialogam com a proposta das canções, bem como a construção do álbum como um todo. Seu flerte com house music e europop tornam essa empreitada ainda mais instigante.

Em outros momentos, Gaga era dark e rock n roll; hoje ela é chromatica e dance.

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